Estou tranquila, na sala, ajudando um aluno numa atividade, quando Fulano denuncia:
---- Tia, Sicrano me chamou de veado!
Eu penso que, realmente, tudo estava muito calmo nesta minha sala de primeiro ano....
---- O que? Como assim? --- Eu pergunto com a intenção de ganhar tempo para pensar à respeito do que estava acontecendo...
---- Ele me chamou de veado na fila do lanche!
---- Mas isso já faz um tempo! Eu não tô entendendo -- não estava mesmo...
---- Foi o Beltrano quem me contou!
---- Beltrano, o que você disse pra ele? Você ouviu o Sicrano chamar o Fulano assim?
---- Não, professora, eu não ouvi. Foi a Fulana que ouviu e me contou. Ai eu tinha que contar, né tia? Eu tinha que falar a verdade...
---- Não, você tinha que falar era pra mim! Eu vou conversar com ele sobre isso - e o menino acusado mantinha-se numa postura muito discreta, esperando que eu nem sequer olhasse pra ele -- O que você fez foi fofoca e muito depois do ocorrido!
Pronto, agora é a vez de inquerir o acusado de seis aninhos:
---- Sicrano, por que você chamou o seu amigo de veado?
---- Ah, não sei tia.
---- Você sabe o que é veado?
---- Não...
Respiro fundo, e lá vai:
---- Veado é um animal que se parece com a rena do Papai Noel, aquela que puxa o trenó dele. Por acaso o nosso amigo se parece com o animal que puxa o trenó do Papai Noel?
---- Não, tia. -- E todos concordam que ele não se parece nem um pouco com a rena.
---- Hum, peça desculpas ao seu amigo. Ele tem nome, não é pra colocar apelido bobo. E você, mocinho, da próxima vez que ouvir um amigo colocando apelido em outro, fale comigo primeiro, entendeu?
Todos entenderam que veado e rena são muito parecidos, que graça é a idade de seis anos.
Mas, ninguém diz algo à toa, a família saberá sobre a palavra dita que, provavelmente, ouvida num contexto diferente, foi repetida sem que se desse sentido ao significado pejorativo, quem sabe não terá mais cuidado? Que saudades dessa fase da infância.
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